Por mais que se invista em infraestrutura logística no país, a
precariedade nesta área persistirá e será um dos principais obstáculos
ao desenvolvimento nacional. Segundo especialistas, os projetos são de
longo prazo, mas os erros antigos permanecem. Falta planejamento que
considere todo o processo, da origem à entrega final, observando a
intermodalidade - quando a carga é transportada por um ou mais veículos
de uma ou mais modalidades de transporte. Isso também ocorre quando os
contratos são firmados com diferentes transportadores, com o uso de
multimodais, nos casos em que a carga faz seu percurso por um ou mais
modais, mas tem um único contrato de transporte e uma única apólice de
seguro.
"Os percursos multimodais não são considerados nos projetos de
logística do governo. Não há conhecimento técnico. Os projetistas nem
sabem do que se trata", diz Paulo Fleury, diretor-executivo do Instituto
de Logística e Supply Chain (Ilos). O pessoal tem cabeça de engenheiro
de ferrovia, engenheiro de porto, de estrada", diz.
Fleury foi um dos palestrantes do painel "Multimodalidade e Cadeia de
Suprimento", apresentado no evento L.E.T.S., promovido em maio pelas
federações estaduais das indústrias de São Paulo e Rio de Janeiro
(Fiesp/Firjan). Para ele, a questão da modalidade começou a ser pensada
no Brasil no final da década de 90. Em fevereiro de 98 foi definido o
que é uma operadora de transporte multimodal (OTM), mas uma série de
problemas burocráticos envolvendo seguros, formulários etc., fizeram com
que as primeiras OTMs surgissem somente em 2005. "Estamos em 2014 e
apenas pouco mais de 400 empresas possuem certificado. Isso mostra a
enorme burocracia que atrapalha a eficiência destes modais", afirma
Fleury.
A matriz de transporte brasileira é composta da seguinte maneira:
66,6% rodoviário; 18,3% ferroviário; 12,1%, aquaviário; 3% é dutoviário.
Aeroviário não existe. Nos Estados Unidos, a maior parte do transporte
(38%) é feita por ferrovias, seguida por rodovias (31,2%), dutos
(20,1%), aquaviários (10,3%) e aeroviários (0,4%). Para o
diretor-superintendente da MTO Logística, Celso Queiroz, que divulgou
esses dados em sua palestra no evento, a desproporção entre os modais
brasileiros explica o fato de o país ter um Produto Interno Bruto (PIB)
logístico entre R$ 500 e R$ 650 bilhões por ano - um volume aproximado
do PIB de países como Chile, Portugal ou Grécia - e os Estados Unidos
produzirem uma logística 25% mais barata que a do Brasil.
As condições "horríveis" da infraestrutura, diz Queiroz, os custos de
dinheiro e tempo da burocracia, os custos trabalhistas, os gargalos
portuários e a falta de balanceamento - que faz com que as rodovias ou
estejam lotadas ou ociosas, dependendo do horário -, são também fatores
que tornam mais cara a logística nacional. "Com as ferrovias que começam
a ser construídas, teremos muita capacidade ociosa, que precisa ser
vendida mais barata, senão não vai para frente. Isto é muito importante,
mas os projetos do governo não tocam nestas questões. Isto é
preocupante", afirmou.
Fleury dá uma ideia do impacto proporcionado pela multimodalidade nos
custos. "Antes do contêiner, que é o principal veículo para a
modalidade, descarregar e carregar um navio de 22 mil toneladas levava,
em média, 149 dias por ano com a embarcação parada no porto. Com o
contêiner, este tempo caiu para 32 dias. O ganho é enorme!"
Anselmo Riso, gerente de Relações Institucionais da Bosch, defendeu a
multimodalidade em sua palestra, argumentando que ela valoriza o uso de
cada modal, aumentando sua eficiência e eficácia, elevando a
produtividade e beneficiando toda a cadeia. "O equilíbrio da matriz de
transporte não precisa vir somente do investimento em outros modais,
pode vir da criação de condições de deslocamento entre eles", afirmou
Queiroz.
Conforme mencionou em sua palestra, André de Almeida Prado, da Atlas
Transportes e Logística, a Organização das Nações Unidas já entende que é
uma necessidade global a existência de transporte multimodal. Mas é
necessário, segundo ele, que sejam avaliados vários fatores, como tipo
de produto e distância, para verificar a conveniência ou não de adotar o
sistema.
"Investir em intermodalidade é muito mais barato e racional do que
investir em cada um dos modais. Mas este investimento não está na pauta
ou raramente se vê em discussão no país", afirmou Queiroz. Segundo
informa, muito pouco da logística brasileira está sobre contêineres.
"Não há como produzir logística sem ociosidade. Mas, com a
intermodalidade e a multimodalidade é possível tornar esta logística
mais produtiva", segundo Queiroz. Segundo acredita, uma nova ordem
logística requer, além da modalidade, tecnologia e inovação, que envolve
o uso de contêineres e a chamada internet das coisas - a conexão entre
máquinas. Queiroz citou o exemplo do Waze, um aplicativo de trânsito e
navegação abastecido por informações de seus usuários. "O Waze seria
impossível de existir se alguém resolvesse investir nele. Seria inviável
bancar um sistema com informações de trânsito de todas as cidades do
mundo. Mas o Waze é fornecido gratuitamente porque existe a internet das
coisas. Cada usuário é responsável por contribuir com o serviço." Ele
calcula que a combinação de modalidade, tecnologia e inovação resultaria
em uma logística 50% mais barata.
Outra vantagem, segundo Fleury, é que os terminais multimodais também
têm a função, de maneira muito rápida, de armazenar produtos. "No
entanto, nenhum plano de estratégia logística do governo federal nos
últimos dez anos fala em armazenagem. Você não encontra esta palavra lá.
Confundem transporte com logística, o que é um erro primário e perigoso
porque o armazém é hoje estratégico, não serve só para guardar
produtos. Aliás, nem deveria guardar, mas processar o produto, fazendo a
transferência de um modal para outro", afirmou o diretor-executivo do
Ilos.
Jornal Valor Econômico - 27/05/2014 -
Comentário:
O blog Ferrovia Intermodal discorda da frase que o assunto da multimodalidade, só começou a ser pensada no Brasil no final dos anos 90, e só ler as postagem sobre o assunto em nosso blog Ferrovia Intermodal: Roadrailer, Rodotrilho e Transtrailer no Brasil, Contêiner e Política industrial e o Sistema SITIC de São Paulo ; onde comentamos o trabalho dedicado e voluntariosos de eng. como Valter Valenzuela, Eduardo Gonçalves David, Ciro Laurenza, Renê Cury entre outros, que nos anos de 1980 viajavam o mundo a serviço da Mafersa, Rede Ferroviária Federal, Fepasa e GEIPOT, estudavam, pesquisavam e tentavam implantar a intermodalidade e multimodalidade no Brasil, inclusive com o apoio dos últimos governos militares, que foram quem mais investiram em infra estrutura junto com os governos de Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek, destacando em São Paulo o Governo de Orestes Quércia, é importante fazer justiça a essas pessoas e instituições; e pesquisarmos o que fizeram e a partir dai estudarmos o que vamos fazer, mesmo nomes como Bernardo Figueiredo, Marcelo Perrupato, Paulo Sergio Passos e Cesar Borges são quadros técnicos de indiscutível conhecimento e que incentivavam e estudavam a questão da intermodalidade e multimodalidade, o grande problema está no setor privado que resiste e são apegados aos seus interesses econômico como é natural que seja, por que a maioria das vezes são empresas familiares e patrimonialistas, principalmente nas empresas rodoviárias de carga que serão afetadas e impactadas com a construção de eixos ferroviários intermodais de carga, que irão mudar o painel logístico dos transportes no Brasil, criando novos cenários na economia dos transportes no Brasil.