Opinião: Economica
Jornal: O Estado de São Paulo
Decisão e disposição para tocar em frente o investimento
em infraestrutura são indispensáveis. Mas encontrar caminhos para fazer
acontecer é passo fundamental. Sem isso, não há como avançar. Depois de
quase dois anos sem um programa econômico nem definição de rumos para
atrair o investidor privado, finalmente o governo Dilma Rousseff
despertou. E como quem desperta de um longo sono e descobre ter perdido
muito tempo, Dilma deu um salto brusco da cama e bradou que quer e vai
fazer. E rápido. Mas demora em encontrar o caminho certo.
Insegurança, indefinições, avanços e recuos e uma perniciosa teimosia
em misturar investimento com ideologia têm marcado as últimas
tentativas do governo em atrair o capital privado para investir em
portos, aeroportos, rodovias, ferrovias, energia e combustíveis. O
grande ausente desta corrida é o sempre esquecido setor de saneamento
básico - construção de redes de esgoto e água adequadas -, justamente no
que o País tem enorme carência, que gera atraso social e saúde precária
da população local.
Ao constatar que não há dinheiro público para tocar os investimentos
de que o País precisa, Dilma passou a atuar no campo da regulação. Ou
seja, arquiteta modelos de contratos de concessão de serviços ao capital
privado em que cabe ao governo definir regras de operação (inclusive em
defesa do interesse público), monitorar a execução e fiscalizar seu
cumprimento. Como fez o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que
criou as agências reguladoras justamente com essa atribuição. Em sua
gestão, o ex-presidente Lula simplesmente ignorou a infraestrutura, mas
Dilma retomou o caminho seguido por FHC.
Criou a estatal Empresa de Planejamento e Logística (EPL) e com ela
tirou dos ministérios setoriais (em destaque o dos Transportes) a
atribuição de planejar e tocar projetos de investimento. Como fez FHC,
ao criar as agências reguladoras, que Dilma tratou de enfraquecer quando
era ministra de Minas e Energia, para recuperar controle e poder. No
momento, a EPL trabalha na concepção de modelos para portos e
aeroportos, mas não interferiu nos casos da renovação das concessões do
setor elétrico e na exploração do petróleo do pré-sal, esta definida
antes da criação da estatal.
Entre os setores que a presidente tenta fazer prosperar, o mais
adiantado e também mais confuso é o de aeroportos. Com uma
particularidade: há urgência em dar uma solução à expansão do Galeão
(Rio de Janeiro) e de Confins (Belo Horizonte), que terão movimentação
multiplicada em 2014 com a Copa do Mundo. Mas como andam os
investimentos de Dona Dilma, caro leitor? Vamos por partes.
Aeroportos.
O governo licitou a concessão dos Aeroportos de
Guarulhos, Viracopos (São Paulo) e de Brasília (Distrito Federal). Mas a
presidente não gostou do resultado, por duas razões: 1) as operadoras
que venceram a licitação são inexperientes e podem se revelar
incapacitadas para controlar o trânsito de mais de 5 milhões de
passageiros/ano; e 2) o desenho da concessão colocou a estatal Infraero
como minoritária, com 49% das ações, e sem poder de controle na gestão
dos três aeroportos.
Disposta a corrigir o que enxergou como erros, Dilma recuou do
primeiro modelo e despachou para a Europa um grupo de altos funcionários
para sondar o interesse de grandes operadoras europeias por uma nova
fórmula em que elas atuariam em parceria com a Infraero, mas em posição
minoritária e com a estatal no comando da gestão. Ouviram um sonoro não.
Quando o ideológico predomina sobre a racionalidade do negócio, o
caminho costuma ser o fiasco. Além disso, é ingenuidade imaginar que
operadoras experientes aceitassem entrar apenas com dinheiro e
conhecimento técnico e submeter-se ao comando de uma estatal, com todos
os defeitos de ingerência política que dão fama às estatais no Brasil.
Diante do fracasso, a equipe de Dilma arquiteta agora um novo
desenho: as empreiteiras ficam fora do consórcio, a Infraero entra com
49% das ações e as operadoras estrangeiras assumem a posição majoritária
das ações e a responsabilidade da gestão dos dois aeroportos (Galeão e
Confins). Além disso, um importante e bem-vindo acréscimo: haverá uma
ação do tipo golden share, que dá ao Estado poder de veto em certas
decisões estratégicas. O governo FHC recorreu à golden share nas
privatizações da Vale e da Embraer, e até hoje não foi necessário a ela
recorrer. Em aeroportos, uma golden share tem a vantagem de prevenir
situações de risco à segurança do País.
Não há, ainda, uma decisão final para o Galeão e Confins, mas
espera-se que o pragmatismo de Dilma prevaleça sobre sua teimosia
ideológica.
Exploração do petróleo.
Se a 11.ª rodada de licitação de novas áreas
de petróleo ocorrer em maio de 2013, como assegurou o governo na
terça-feira, o Brasil terá completado quatro anos e cinco meses vivendo a
absurda situação de renunciar (sem motivo aceitável) a explorar um
produto com alto potencial de gerar empregos, renda, progresso, divisas,
crescimento econômico e poder de engordar o Produto Interno Bruto
(PIB).
É inexplicável os governos Lula e Dilma terem passado tanto tempo
sentados em cima de tamanha riqueza sem explorá-la. A desculpa de o
Congresso Nacional não ter aprovado a lei da divisão dos royalties do
petróleo do pré-sal, além de não valer para as áreas que serão listadas
na 11.ª rodada, é fora de propósito. Na verdade, o governo desistiu de
pressionar o Congresso para apressar a aprovação dessa lei, como fez com
tantas outras e mostrou que, quando quer, é capaz de domar o Poder
Legislativo. Vejamos agora se, no caso do petróleo, realmente acontece o
brusco despertar de um longo e profundo sono.
Energia.
Foi bem-vinda a decisão de reduzir a tarifa da energia
elétrica, mas o governo o fez de forma tão autoritária, sem dialogar com
as empresas, que vai conseguir é atrasar o processo, além de provocar
demissões de funcionários, como já foi anunciado por Furnas e que será
seguido pelas demais empresas do grupo Eletrobrás (Eletronorte e Chesf).
Portos.
O governo trabalha em alternativas para atrair o investidor
privado e expandir a capacidade portuária. A que leva menor chance pode
ser a melhor: privatizar as empresas Docas, que administram os portos do
País.
Jornal O Estado de S.Paulo
23 de setembro de 2012 | 3h 08
SUELY CALDAS -
JORNALISTA; É PROFESSORA DE COMUNICAÇÃO DA PUC-RIO.
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