ARTIGOS - PLANEJAMENTO DE CAPACIDADE NUM TERMINAL DE CONTÊINERES VIA SIMULAÇÃO - UM ESTUDO DE CASO
Data: 15/07/2009 Peter Wanke e Frederico Barros |
INTRODUÇÃO
Atualmente, o contêiner é a forma mais
utilizada para movimentar materiais e produtos pelo modal marítimo. Yun
& Choi (1999) salientam que mais de 90% da carga internacional são
movimentados via portos e terminais e que 80% desse volume são
acondicionados em contêineres.
Naturalmente, o aumento da procura por
esse serviço gera um impacto direto na infraestrutura dos terminais
portuários. Hyland (2001) salienta que o setor portuário apresenta
alguns desafios: o aumento do volume de carga com o consequente
congestionamento nos portos; o balanceamento dos fluxos rodoviário e
ferroviário na hinterlândia1; o advento dos meganavios de contêineres e a
busca constante pela adequação da capacidade dos terminais ao tráfego
marítimo. Neste contexto, surge a necessidade de se utilizar uma
ferramenta capaz de mensurar e prever os efeitos gerados pelo aumento da
movimentação de contêineres nos terminais, permitindo uma melhor
preparação para os desafios citados por Hyland.
Já no início dos anos 90, Wadhwa (1990)
revelou que a solução para os desafios do setor portuário passa pela
utilização de modelos de simulação. A idéia é usar a simulação como uma
possível ferramenta para medir os efeitos das mudanças em variáveis
operacionais, tecnológicas e de investimentos, apoiando, dessa forma, as
autoridades e gestores portuários no processo de tomada de decisão. De
fato, muitos estudos estão convergindo para o uso da simulação no
dimensionamento e planejamento das operações portuárias, tendo sido
obtidos resultados bastante satisfatórios.
Neste trabalho, nos concentramos em
observar como o aumento da taxa de chegadas de navios em um terminal e,
consequentemente, o aumento do número de contêineres movimentados
influenciam o desempenho das operações portuárias e causam impacto no
dimensionamento da capacidade do pátio de contêineres. Para atingir tal
objetivo, desenvolvemos um modelo de simulação para representar as
operações portuárias típicas de um terminal de contêineres.
REVISÃO DA LITERATURA
Para construir um modelo de simulação, é
necessário compreender bem todo o processo que será simulado. Em
terminais de contêineres, Casaca (2005) destacou que são três as
principais etapas do processo de movimentação: aquela que ocorre no
ancoradouro (berço), ou seja, na interface com o mar; aquela que se dá
no pátio de contêineres e aquela dos portões de acesso rodoviário e
ferroviário. Essas três etapas são entrelaçadas, sendo que o desempenho
de cada uma delas afeta o desempenho da outra.
Além disso, a produtividade em cada uma
dessas etapas depende de uma série de fatores, sendo estes estruturais,
organizacionais e tecnológicos, dentre outros. Desse modo, percebemos
que as operações portuárias são bastante complexas por natureza e que
exigem sofisticadas técnicas de modelagem. A simulação possui um papel
importante com relação à melhoria de processos e ao aumento da
eficiência, basicamente porque possibilita identificar possíveis
problemas e gargalos, antecipando o curso de ação a ser tomado pelo
gestor (Bowersox, 1978). E, em se tratando de terminais de contêineres
que possuem ativos muito caros, como berços, portêineres e espaço, tal
técnica ajuda a evitar investimentos desnecessários, que não trazem
nenhuma vantagem imediata ao sistema como um todo.
Em seu artigo, Shabayek & Yeung (2002)
apontam algumas possíveis aplicações da simulação como ferramenta de
apoio ao planejamento de um terminal de contêineres:
• na análise de custo e de nível de
serviço, pois a simulação permite avaliar dois importantes parâmetros: o
tempo médio de espera dos navios na fila e a taxa de utilização dos
berços, necessários para determinar quando e em quanto a capacidade do
terminal deve ser expandida;
• no dimensionamento do número de vagas
necessárias para caminhões, a fim de se evitar possíveis custos, como
multas e penalizações;
• na escolha da melhor política de
sequenciamento/prioridade dos navios na fila, minimizando dessa forma os
gastos com demurrage (sobrestadia).
Um estudo realizado por Kia et al. (2002)
também mostrou que as etapas do processo de movimentação num terminal de
contêineres estão diretamente conectadas e que a simulação se destaca
como importante ferramenta de apoio ao planejamento e tomada de decisão
(corroborando Casaca). Baseando-se num terminal de contêineres do porto
australiano de Melbourne, Kia et al. obtiveram, como resultados
relevantes ao planejamento de capacidade, os seguintes direcionamentos:
(1) a necessidade de criar centros de distribuição internos para melhorar a operação do terminal;
(2) a ampliação do pátio de contêineres, para diminuir manuseios desnecessários, reduzindo o tempo de carregamento/descarregamento do navio e
(3) o aumento do número de berços.
(1) a necessidade de criar centros de distribuição internos para melhorar a operação do terminal;
(2) a ampliação do pátio de contêineres, para diminuir manuseios desnecessários, reduzindo o tempo de carregamento/descarregamento do navio e
(3) o aumento do número de berços.
Utilizando um software de simulação, mas
com foco em questões mais operacionais, como a alocação de ancoradouros e
a priorização de navios na fila, Wanke & Cortes (2008/2009)
desenvolveram um modelo com o objetivo de avaliar como diferentes normas
de alocação e de fila afetam os custos de demurrage. Foi identificado
que essas decisões dependem não apenas das especificidades de cada navio
que para no terminal, mas também de seu conjunto. Como exemplos de
especificidades destacam-se a frequência de visitas por ano, tamanho da
embarcação, tempo de operação, etc.
Esses são alguns exemplos da
aplicabilidade da simulação no planejamento dos terminais de
contêineres. No nosso estudo, foi desenvolvido um modelo para extrair
informações sobre o comportamento da taxa de utilização dos berços (ou
ancoradouros), do tempo de espera e da quantidade de navios na fila para
atracar, da movimentação de contêineres no terminal e da fila de
caminhões e de trens esperando para descarregar ou carregar, em função
do aumento da taxa de chegada dos navios no terminal.
O CASO ESTUDADO
Como dito anteriormente, o primeiro passo
na construção de um modelo de simulação é entender os processos
envolvidos na operação que será simulada. No nosso caso, simulamos as
operações em um terminal de contêineres que possui dois berços (ou
ancoradouros).
Logo após sua chegada, o navio se dirige
para uma única fila e só é liberado quando um dos dois berços estiver
livre. Quando atraca, no berço, inicia-se a etapa de descarregamento do
navio. Cada berço está equipado com dois portêineres e ambos operam
simultaneamente no navio atracado. Quando a etapa de descarregamento do
navio é concluída, dá-se início à etapa de carregamento. Após ser
totalmente carregado, o navio sai do porto, liberando o berço.
Paralelamente às chegadas dos navios,
ocorre a chegada de caminhões carregados com contêineres, de trens e de
caminhões vazios para buscá-los no porto. Vale destacar que o trem
apenas descarrega contêineres no terminal, saindo de lá vazio. Para
efeitos apenas de modelagem, foi considerado um terminal com dois pátios
de contêineres: um para os que são descarregados do navio e outro para
os que chegam por caminhão e por trem e que serão embarcados no navio.
Tanto para entrar no porto quanto para sair, os caminhões e trens passam
pelos portões (gates) onde são feitas a pesagem e a inspeção da carga. O
modelo descrito está representado em detalhes no fluxograma anexo
(Anexo 1).
Além disso, para uma maior fidelidade do modelo à realidade, foram observados os seguintes aspectos:
• A prioridade adotada de atracação dos navios na fila foi a PEPS (primeiro que entra, primeiro que sai);
• A tecnologia utilizada para o
descarregamento/carregamento de contêineres do navio foi a do carrossel.
Nela, na etapa de descarregamento, por exemplo, ao retirar o contêiner,
o portêiner já o descarrega diretamente em um caminhão que se dirige ao
pátio onde o contêiner será descarregado por uma empilhadeira e
colocado em seu respectivo lugar. O caminhão, agora vazio, retorna ao
portêiner para transportar mais contêineres ao pátio. O mesmo ocorre na
etapa de carregamento do navio, porém com a ordem dos processos
invertida.
• Tendo em vista que um portêiner é um
ativo muito caro (da ordem de milhões de reais), o número de caminhões
que participam do carrossel deve ser tal que o equipamento não fique
parado esperando os caminhões retornarem do pátio de contêineres. Conforme já foi colocado, o estudo teve como finalidade básica avaliar como a variação nos tempos entre chegadas de navios interfere no desempenho das operações no terminal. Para isso, conduzimos experimentos nos quais os tempos entre chegadas de navios foram diminuindo e fixamos todos os outros dados de entrada, coletando informações sobre:
(1) a fila de navios esperando para atracar;
(2) o tempo de espera dos navios na fila;
3) a taxa de utilização dos berços;
(4) a quantidade de contêineres movimentada por ano;
(5) a fila de caminhões no porto e
(6) a fila de trens para descarregar. A variação dos tempos entre as chegadas dos navios pode ser observada na Tabela 1.
Para escolher que tipo de distribuição
seria usada para representar os tempos entre chegadas de navios, de
trens e de caminhões no porto, nos baseamos em um estudo feito por
Dragovic et al. (2005), que presumiram a distribuição exponencial.
Segundo os autores, a distribuição exponencial é uma das mais adotadas
na literatura para representar tempos entre chegadas. Por sua vez, para
representar a quantidade de contêineres carregados e descarregados do
navio, utilizou-se uma distribuição triangular de parâmetros de 150, 200
e 250, representando mínimo, médio e máximo, respectivamente.
Finalmente, para cada um dos experimentos foram realizadas 25
replicações de 365 dias de duração. Tal procedimento é necessário para
garantir a validade estatística dos resultados, permitindo a realização
de análises multivariadas com os níveis de significância desejados.
ANÁLISE DOS RESULTADOS
São apresentados aqui os resultados médios
obtidos a partir das 25 replicações de cada um dos experimentos. No
Gráfico 1 é apresentado o comportamento da taxa de utilização dos berços
em função do intervalo de tempo entre chegadas de navios. Pelo fato de
não existir priorização na alocação dos navios nos berços, os valores
apresentados correspondem a uma média aproximada da taxa de utilização
dos dois berços.
Conforme esperado, a taxa de utilização
aumenta à medida que o intervalo de tempo entre chegadas de navios
diminui, ou seja, à medida que mais navios atracam no porto por
intervalo de tempo. A etapa seguinte analisou qual o impacto desse
aumento sobre o tamanho na fila de navios para atracar e seu tempo de
espera.
Numa visão mais detalhada dos gráficos
sobre o comportamento do tamanho da fila de navios e do tempo de espera
destes na fila, podemos perceber que até uma taxa de utilização dos
berços de 0,40 o terminal apresenta bom desempenho, com uma pequena fila
de navios e um tempo de espera bastante reduzido. Porém, aumentando
ainda mais taxa de utilização do berço, os resultados indicam que o
terminal começa a apresentar sinais de saturação. Isso se reflete
negativamente no desempenho operacional, gerando tamanho de fila muito
acima do aceitável e também tempos de espera que podem implicar em
elevados custos de sobrestadia.
Fica claro que, se a demanda por esse
terminal aumentar a ponto de a taxa de utilização ficar, por exemplo,
superior a 0,40, ações devem ser tomadas a fim de se manter um nível de
serviço satisfatório. Essas ações podem abranger mudanças nos próprios
berços existentes, como a utilização de mais portêineres, ou até mesmo a
construção de um novo berço, aumentando a capacidade de atendimento do
terminal. Cabe ressaltar que os operadores de navios vêm se tornando
mais exigentes e, quando não percebem certas garantias de
disponibilidade de berços nos terminais, buscam alternativas para manter
um alto nível de serviço (Luo e Grigalunas, 2003).
Como dito anteriormente, apenas o dado de
entrada tempo entre chegadas de navios foi variado. Logo, é esperado que
as filas de caminhões e de trens no porto se mantenham estáveis em
todos os experimentos, o que é de fato verificado nos Gráficos 4 e 5.
Os resultados apresentados foram obtidos
por meio do uso da simulação. Sem dúvida, isso gera certo trabalho na
hora de rodar diferentes cenários, com dados de entrada diferentes, pois
uma grande parte das etapas da simulação deve ser feita novamente. A
fim de gerar uma equação que represente o comportamento de uma variável
em função das outras variáveis e evitar o exaustivo processo de geração e
coleta de dados, levamos os resultados dos cenários simulados ao SPSS
15.0 (pacote estatístico), para determinar um conjunto de regressões
lineares múltiplas que permita descrever os dados de saída em função dos
dados de entrada.
Como exemplo, a equação que representa o comportamento da fila de navios para atracar é dada por:
Como exemplo, a equação que representa o comportamento da fila de navios para atracar é dada por:
y = -11,810 – 3,425 x + 783,465 z (R-Quadrado = 0.91),
onde:
y = tamanho médio da fila de navios para atracar;
x = tempo entre chegadas de navios;
z = tempo entre chegadas de caminhões.
onde:
y = tamanho médio da fila de navios para atracar;
x = tempo entre chegadas de navios;
z = tempo entre chegadas de caminhões.
Resultados desse tipo permitem ao tomador
de decisão avaliar rapidamente como aumentos na taxa de chegada afetam o
tamanho médio da fila, sem precisar recorrer à execução de novos
experimentos para verificar os impactos de um cenário em particular.
Outra área de interesse do estudo foi o
pátio de contêineres. Os resultados obtidos envolvem dois aspectos
relevantes para a análise: o volume total de contêineres movimentados
por ano no terminal e a quantidade de posições necessárias para acomodar
esses contêineres no dia a dia. Em relação ao volume movimentado por
ano, o que se espera – e que de fato pode ser observado no Gráfico 6 – é
o aumento do volume movimentado no terminal decorrente do aumento da
taxa de chegada de navios e do consequente aumento na taxa de utilização
dos berços. Tal informação possibilita estimar a capacidade efetiva de
movimentação do terminal em perto de 250 mil contêineres/ano.
No entanto,
para avaliar o número de posições de armazenagem necessárias para se
acomodar esse volume anual, deve ser feito um levantamento da flutuação
da quantidade de contêineres no pátio ao longo do tempo, dia a dia
(conforme Gráfico 7). Como não existe a possibilidade gerencial efetiva
de um navio ou um caminhão ter que esperar por falta de espaço no pátio,
a quantidade de posições deve ser pelo menos igual ao pico diário
registrado, o que é facilmente identificado no gráfico.
Nesse caso, o pátio de contêiner deve ter capacidade, pelo menos, para 4.809 posições.
CONCLUSÃO
A simulação aparece como importante ferramenta para planejamento das operações portuárias. E mais, os resultados gerados são de caráter gerencial, possibilitando traçar estratégias e direcionar investimentos. No nosso estudo, o primeiro passo foi identificar a configuração atual das operações portuárias e, depois, gerar cenários futuros, aumentando a taxa de chegada de navios, para, finalmente, poder avaliar o impacto gerado no desempenho do terminal.
Os resultados mostraram que esse aumento na taxa de chegadas de navios gera um impacto significativo na taxa de utilização dos berços e, consequentemente, no tamanho da fila de navios e no tempo de espera. Também foi possível observar que, a partir de uma taxa de utilização dos berços de 0,40, os níveis de desempenho aos usuários do terminal começam a se mostrar insatisfatórios, sinalizando a iminente saturação das operações.
Para evitar esse cenário, torna-se necessário aumentar a capacidade de carregamento/descarregamento nos berços existentes ou investir na construção de outro berço. Porém, é importante destacar que nenhum investimento no aumento da capacidade dos berços terá efeito se o terminal não possuir posições suficientes para armazenar todos os contêineres, indicando, para o tomador de decisão, a necessidade de uma análise criteriosa para identificação dos reais gargalos do sistema portuário.
BIBLIOGRAFIA
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systems integration of physical distribution and materials management.
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Dragovic, B; Park, N. K.; Radmilovic, Z.; e
Maras, V.. Simulation modelling of ship-berth link with priority
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Hyland, T.. Four east coast ports share growth strategies. Trans
portation & Distribuition, Junho 2001.
portation & Distribuition, Junho 2001.
Kia, M.; Shayan, E; & Ghotb, F..
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Luo, M.; Grigalunas, T.. A
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Forum, vol 15, Part 1, 1990.
Wanke, P. F. & Cortes, J. D .. O PCP
dos Portos: simulando a ligação navio-ancoradouro para redução dos
custos totais de demurrage (sobrestadia). Revista Tecnologística –
dezembro, 2008, e janeiro, 2009.
1 Região do país servida por meio de vias de transporte terrestres, fluviais ou lacustres, para a qual se encaminham de forma direta as mercadorias desembarcadas no porto ou da qual se originam mercadorias para embarque no mesmo porto.
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