O governo não conseguiu apertar o acelerador dos investimentos públicos
que havia planejado para o setor de transportes. Os desembolsos
previstos para obras em rodovias, ferrovias e hidrovias, ações encaradas
como principal antídoto contra a estagnação econômica, não decolaram na
velocidade desejada. O ano de 2012 chega ao fim carimbado como uma das
piores execuções orçamentárias do setor de transportes nos últimos
tempos. Esse cenário é revelado a partir de informações do Sistema de
Administração Financeira (Siafi). Os dados foram estruturados pela
coordenação de infraestrutura do Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (Ipea).
O plano desenhado para as estradas federais
previa a execução total de R$ 13,627 bilhões ao longo deste ano. Até
esta semana, apenas 48,3% desse montante - R$ 6,581 bilhões - havia sido
executado. O cenário projetado até 31 de dezembro é pouco estimulante.
Se confirmada a média histórica dos últimos anos relativa aos
desembolsos feitos no último bimestre, a projeção aponta para uma
execução de apenas 57,9% do total previsto para as estradas federais,
chegando a R$ 7,897 bilhões no ano. É preciso destacar ainda que quase
70% dessa execução deve-se, exclusivamente, à quitação de restos a
pagar, ou seja, pagamento de contratos que foram firmados antes de 2012.
Trata-se do resultado mais tímido registrado pelas rodovias desde 2008
(ver quadro).
A situação não é diferente nas ferrovias. O
transporte sobre trilhos, que contava com R$ 2,751 bilhões para
investimento neste ano, só recebeu R$ 740 milhões até agora, o que
equivale a apenas 26,9% do planejado. Dada a média histórica de suas
execuções anuais, chegará a 31 de dezembro com menos de um terço do
total previsto, cerca de R$ 888 milhões, o pior resultado desde 2007,
quando teve início o segundo mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula
da Silva.
Mais complicada que a situação de estradas e ferrovias é
a realidade encarada pelas hidrovias. As estradas de água, que já
chegaram a ter um pacote de projetos idealizado pelo governo, acabaram
praticamente excluídas das prioridades do Programa de Aceleração do
Crescimento (PAC 2). As ações para melhorar o transporte pelos rios
começaram 2012 com previsão de R$ 817,6 milhões em investimento público.
Chegaram a esta semana com execução de R$ 309 milhões (37,8% do total) e
devem concluir o ano com, no máximo, 45,4% do previsto. Será o
resultado mais fraco dos últimos oito anos.
"O governo iniciou o
ano falando muito da necessidade de se ampliar os investimentos em
infraestrutura, mas o cenário mostra, claramente, que ele não conseguiu
deslanchar", diz Carlos Campos, coordenador de infraestrutura econômica
do Ipea.
O Ministério dos Transportes faz uma avaliação diferente
deste cenário. Por meio de nota, a pasta declarou que, até o fim deste
exercício, seu desempenho financeiro "se situará dentro da média anual
de execução" do setor. "Cabe destacar que diversas obras prioritárias
foram concluídas e outras de igual importância para o país estão em
andamento, tais como a duplicação da BR-060/GO (Goiânia -Jataí) e a
construção da BR-448/RS, BR-116/RS, BR-163/PA, empreendimentos cujo
volume de execução é bastante satisfatório", informou o ministério.
"Devem-se
considerar ainda as novas obras de manutenção, construção, duplicação e
adequação de capacidade que serão contratadas e que permitirão um
grande avanço nos níveis de investimento", declarou a Pasta dos
Transportes, sem detalhar essas informações.
Segundo o
ministério, o ano se valerá ainda dos resultados que vêm sendo
alcançados com a "atuação destacada do Fundo da Marinha Mercante",
unidade vinculada à pasta, que vem promovendo o financiamento de
embarcações para a Marinha Mercante. "Atualmente há 257 embarcações
contratadas, além da geração significativa de empregos", afirmou o
ministério.
No ano passado, a execução de obras de transporte foi
prejudicada por causa da crise de corrupção no setor, que explodiu em
junho, levando à queda da cúpula do ministério e até à paralisação
temporária, por determinação da presidente Dilma Rousseff, de
contratações de obras públicas. "Esperava-se que neste ano os projetos
retomassem o ritmo, mas uma série de problemas com a baixa qualidade de
projetos de engenharia, a necessidade de fazer desapropriações e as
dificuldades para obtenção de licenciamento ambiental impactaram no
resultado", avalia Carlos Campos, do Ipea.
Hoje, são raros os
casos de obras do setor que não param nas malhas do Tribunal de Contas
da União (TCU) ou do Ministério Público Federal (MPF). É o caso das
prometidas obras de recuperação, restauração e manutenção das BRs 163 e
364, no Mato Grosso, principais rotas de escoamento da agroindústria do
país. O orçamento total das obras chegava a R$ 247 milhões. Depois de
analisar os editais e projetos, o TCU encontrou falhas nos estudos, que
levariam a um superfaturamento superior a R$ 28 milhões. Nas duas
rodovias, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes
(Dnit) estimou uma largura média de dois metros para os acostamentos,
mas o próprio projeto licitado apontava para uma medida inferior. A
licitação acabou suspensa em março pelo Dnit. Na semana passada, a
autarquia publicou um novo edital para contratação das obras. A
concorrência será realizada por meio do Regime Diferenciado de
Contratação (RDC), com o propósito de acelerar a execução. Alguns
trechos da BR-163 têm obras em andamento.
Nas ferrovias Norte-Sul
(FNS) e Oeste-Leste (Fiol), tocadas pela Valec, as obras pouco
avançaram neste ano, por conta de problemas semelhantes, além de uma
enorme dificuldade para desembaraçar o nó de milhares processos de
desapropriações que se situam no traçado dos trilhos.
Autor(es): Por André Borges | De Brasília |
Valor Econômico - 25/10/2012 |