Grupos especializados em infraestrutura de transporte planejam emitir quase R$ 3 bilhões em debêntures nos próximos meses. Desse montante, menos de 10% correspondem às chamadas debêntures de infraestrutura - modalidade que concede benefícios fiscais a compradores dos papéis. Segundo especialistas, o novo mecanismo de captação de recursos, embora mais atrativo para o investidor, não é usado em larga escala pelas empresas devido ao apelo da fonte mais tradicional de financiamento ao setor: o BNDES.
As debêntures de infraestrutura são uma iniciativa para estimular o
financiamento privado de longo prazo. Criadas em 2010 (por medida
provisória e depois consolidado na lei 12.431, de 2011), concedem
isenção de Imposto de Renda ao investidor pessoa física.
Chamadas também de debêntures incentivadas, elas têm de ser
destinadas a investimentos em infraestrutura (logística e transporte,
mobilidade urbana, energia, telecomunicações, radiodifusão, saneamento
básico e irrigação). Diferentemente das debêntures tradicionais, elas
exigem como contrapartida um investimento real, e por isso não podem ser
destinadas a outras aplicações, como reforço ao chamado capital de
giro.
Das seis companhias do segmento de transportes com planos de novas
debêntures, duas devem usar o mecanismo incentivado. concessionária de
ferrovias América Latina Logística (ALL) pretende emitir R$ 160 milhões
em papéis da nova modalidade. Já a CCR, de rodovias, emitirá R$ 100
milhões por meio da controlada CCR AutoBan (concessionária do Sistema
Anhanguera-Bandeirantes).
Os especialistas apontam diferentes causas para o uso moderado do
novo mecanismo de dívida até agora. Um dos motivos mais mencionados são
as dúvidas que vigoravam sobre a regulamentação. Nos últimos meses, o
governo acabou com a maior parte delas. Ficou claro, por exemplo, que o
investidor está livre de penalidades caso a empresa não destine os
recursos a investimentos em infraestrutura (e sim à rolagem de dívida,
por exemplo). Com os esclarecimentos e com os juros de mercado em baixa,
a debênture de infraestrutura pode se tornar um instrumento mais
recorrente.
Para Márcio Guedes, diretor da Associação Brasileira das Entidades
dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), as debêntures estão
começando a ser mais competitivas, embora o banco ainda seja uma
preferência. O BNDES sempre foi a única alternativa de longo prazo no
país, mas a demanda por recursos chegará a um nível incompatível com o
banco, diz.
Mesmo com os esclarecimentos sobre o novo instrumento, as empresas
continuam preferindo o BNDES. Os recursos de ambos (debêntures incentivadas e banco de fomento) têm a mesma destinação e competem pela
preferência das companhias, sendo que o BNDES é mais atrativo por conceder prazo de pagamento maior e taxas mais baixas. Embora haja queda
nos juros cobrados pelo mercado de capitais, a Taxa de Juros de Longo
Prazo (cobrada pelo BNDES) também caiu - para 5,5%.
Na ALL, 80% dos investimentos são financiados pelo banco estatal. O
BNDES ainda tem a linha mais longa e o custo mais atrativo, resume
Rodrigo Campos, diretor financeiro da empresa ferroviária.
Sérgio Lazzarini, professor do Insper Instituto de Ensino e Pesquisa,
defende que o banco reduza sua atuação para dar espaço a outras
alternativas. O BNDES poderia diminuir a participação em projetos mais
fáceis de serem financiados pelo mercado de capitais, para que esse
mercado tenha um espaço para crescer, diz.
O presidente da Odebrecht Transport, Paulo Cesena, concorda com a
redução do papel do banco. No Peru não tem BNDES e tem que correr atrás
de US$ 500 milhões. O sujeito luta e consegue, exemplifica, se referindo
a um contrato obtido pelo grupo brasileiro naquele país. A gente
costuma recomendar ao BNDES que tenha um papel importante, mas não
predominante, e que abra espaço para outras fontes de financiamento,
disse em evento recente sobre infraestrutura.
A posição, no entanto, não é unânime. Ontem, o presidente do grupo,
Marcelo Odebrecht, defendeu a atuação do banco dizendo que a instituição
corrige as taxas praticadas em financiamentos privados. O BNDES entra
para corrigir uma distorção do mercado. Não acho que ele tenha que se
reduzir, mas sim o mercado de capitais crescer no espaço do banco.
05/10/2012 - Valor Econômico
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