por Wilen Manteli,
presidente da Associação Brasileira de Terminais Portuários (ABTP)
publicado no Jornal Estadão
O governo, antes de anunciar o
novo pacote de medidas para os portos, vem ouvindo empresas e entidades
com o objetivo de colher sugestões para destrancar investimentos e
melhorar o desempenho do setor. Vários problemas já foram identificados,
entre eles o fato de a administração dos portos, tal qual funciona
hoje, não mais responder às crescentes necessidades do comércio
exterior.
Está certa a avaliação do governo.
A modelagem de uma gestão portuária moderna poderá resolver os
principais problemas e gargalos que atormentam os operadores, armadores e
usuários. À guisa de solução foram apontadas várias possibilidades.
Entre elas, a reestruturação das atuais Companhias Docas, a criação de
condomínios e a transferência das administrações portuárias para o setor
privado. No caso da privatização, os interessados pretendem transformar
os Conselhos de Autoridade Portuária (CAPs) em órgãos consultivos.
Para responder à permanente
exigência de produtividade do mercado global, o setor portuário deve
incorporar mudanças, sem dúvida. Mas a proposta de mudança nos CAPs
precisa ser previamente conhecida e aprofundada, dado que esses órgãos
albergam a participação da sociedade. Nos portos em que a administração
continuar pública, os CAPs devem permanecer. No entanto, ter-se-á de
desconstruir o argumento que pretende justificar a diminuição dos seus
poderes a pretexto de eliminar supostas barreiras colocadas pelos
operadores portuários à entrada de novos concorrentes e de destravar
pedidos de aumentos tarifários apresentados pelas administradoras dos
portos.
Esse argumento é desmentido pelos
fatos. Se áreas portuárias ociosas não são postas à disposição para
novos operadores, a responsabilidade é das próprias administradoras dos
portos, às quais incumbe tomar as providências iniciais para a
realização de licitações. Mesmo que algum operador específico
pretendesse alijar potenciais concorrentes, em face da composição e do
processo decisório do CAP, ele não teria nenhuma chance de sucesso nessa
empreitada.
A figura do CAP foi criada para
democratizar e descentralizar a governança dos portos, antes exercida de
forma autocrática pela Portobrás. Sua estrutura é formada por quatro
blocos representativos dos principais atores do setor, e o presidente do
CAP é um representante do governo federal, que tem voto de Minerva.
Como o próprio nome denota, o conselho é uma autoridade, ou seja, tem
poder deliberativo, prerrogativa que só pode ser modificada ou cassada
pelo Poder Legislativo.
A segunda parte do argumento é
igualmente frágil, pois se apoia na falsa premissa de que aumentos de
tarifa portuária produzem necessariamente melhorias na eficiência do
sistema. A experiência tem mostrado o contrário. Durante o longo período
em que as Companhias Docas, respaldadas pela Portobrás, puderam
aumentar suas tarifas sem controle externo, o decorrente aumento do
custo para o exportador brasileiro não teve contrapartida à altura nem
na manutenção e/ou expansão da infraestrutura aquaviária nem na
produtividade das operações portuárias. Os acréscimos tarifários foram
literalmente "dragados" para cobrir ineficiências administrativas,
passivos trabalhistas e uma série de outros desequilíbrios inerentes ao
modelo anacrônico de gestão das Companhias Docas.
Porto não é modal de transporte,
e, sim, um elo estratégico da cadeia logística do comércio exterior.
A
natureza dessa atividade se assemelha à do "arranjo produtivo", cujo
êxito depende da redução de custos e dos ganhos de escala. Se o governo
quer mudar o modelo de gestão dos portos, deve aproveitar o momento para
separar as instâncias política e administrativa, cuja contaminação
recíproca tem causado prejuízos à sociedade. A autoridade sobre o
sistema portuário é prerrogativa do Estado, sem dúvida, mas a
administração, esta pode ser privatizada ou remodelada segundo o
conceito de parceria público-privada.
Porto Gente
Texto publicado em 03/10/2012 - 12:37
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